Africanidades no Recôncavo Baiano e o Novembro Negro
A África, berço da humanidade, possui uma riqueza cultural e histórica que moldou o mundo de maneiras profundas e duradouras. No Brasil, especialmente no Recôncavo Baiano, as africanidades permeiam diversas dimensões da sociedade, desde a música, dança e gastronomia até as lutas políticas e estruturas sociais. Este artigo destaca como essas africanidades sustentam resistências no Recôncavo, com ênfase no Novembro Negro, mês de reflexão e (re)conscientização do povo negro.
O Recôncavo Baiano e suas Africanidades
O Recôncavo Baiano é um território de memória, luta e celebração. Considerado um dos berços da cultura afro-brasileira, essa região guarda marcas profundas da diáspora africana em seus modos de vida, tradições e práticas sociais. Nos campos cultural, político, social e identitário, as africanidades emergem como elementos centrais para entender não apenas o passado, mas também os desafios e conquistas do presente.
Em novembro, conhecido como Novembro Negro, as reflexões em torno das africanidades ganham ainda mais força, especialmente com o Dia da Consciência Negra, celebrado em 20 de novembro. Este mês é um convite para relembrar a resistência de Zumbi dos Palmares e outros líderes negros, além de reafirmar a importância da valorização contínua da história e cultura africana no Brasil.
Cultura e Identidade
O Recôncavo abriga expressões culturais africanas como o samba, candomblé e capoeira. Essas manifestações transcendem a arte, sendo formas de resistência e reconstrução identitária. Kabengele Munanga (2008) ressalta que a cultura africana foi recriada no Brasil, adaptando-se às condições locais.
O candomblé, por exemplo, vai além da prática religiosa, assumindo papel central contra o apagamento cultural. Segundo Antônio Bispo dos Santos (2023), “a terra e a cultura são inseparáveis”, com os terreiros sendo espaços de conexão ancestral e comunitária.
A música e a dança, como o samba, perpetuam narrativas coletivas que resistem ao apagamento histórico. Autores como Conceição Evaristo expressam vivências da negritude e complexidades da diáspora em suas obras, enquanto Abdias do Nascimento ressignifica memórias africanas, promovendo diálogos transculturais.
Racismo Estrutural
Apesar de sua riqueza cultural, comunidades negras no Recôncavo enfrentam desafios sociais significativos. O racismo estrutural se evidencia na desigualdade de acesso à educação, saúde e emprego. Altas taxas de analfabetismo e pobreza entre populações negras na Bahia refletem esse cenário.
O Novembro Negro torna-se essencial para denunciar essas injustiças. Políticas públicas como cotas raciais e educação quilombola resultam das lutas dos movimentos negros no Brasil, buscando reparação histórica e valorização da população negra.
Política e Resistência
A resistência também se expressa na política. Movimentos como o Movimento Negro Unificado (MNU) e comunidades quilombolas defendem direitos culturais e territoriais. Líderes como Lélia Gonzalez e Abdias do Nascimento destacaram questões como o genocídio da juventude negra e o racismo institucional, promovendo um sistema mais inclusivo.
Filosofias africanas, como o Ubuntu, oferecem alternativas éticas que guiam políticas públicas humanas e inclusivas. A territorialidade, enfatizada por Bispo dos Santos, transcende o aspecto econômico, representando uma continuidade histórica e cultural.
Identidade e Meio Ambiente
Ao falar de africanidades, é impossível ignorar a relação intrínseca entre a identidade negra e o cuidado com o meio ambiente. Kopenawa (2017), embora represente uma voz indígena, compartilha perspectivas similares às de Bispo dos Santos sobre a inseparabilidade entre cultura e natureza. No Recôncavo, essa conexão é visível nas práticas agroecológicas e celebrações que honram a terra e as águas, enraizadas em saberes ancestrais africanos. Terras quilombolas preservam biodiversidade e fortalecem identidades coletivas, alinhando-se às perspectivas de autores como Davi Kopenawa e Bispo dos Santos.
Conclusão
O Novembro Negro nos lembra que as africanidades são, acima de tudo, uma forma de resistência e resiliência. No Recôncavo Baiano, essa herança não é apenas preservada, mas reinventada a cada geração.
A luta contra o racismo, a valorização das culturas afro-brasileiras e a defesa dos territórios quilombolas são batalhas interligadas que exigem atenção contínua. Como destaca Antonio Archangelo (2022), “resistir para existir”. Essa resistência está presente no tambor que ecoa nos terreiros, nas mãos que plantam e colhem em harmonia com a terra, e nas vozes que exigem justiça e igualdade.
Referências Bibliográficas
- ARCHANGELO, Antonio. Resistir para existir. Diário do Rio Claro, 2022. Disponível em: https://www.j1diario.com.br/resistir-para-existir-por-antonio-archangelo/. Acesso em: 25 nov. 2024.
- BRASIL. Lei nº 10.639, de 09 de janeiro de 2003.
- EVARISTO, Conceição. Olhos d’água. Rio de Janeiro: Pallas, 2014.
- MUNANGA, Kabengele. Rediscutindo a mestiçagem no Brasil: identidade nacional versus identidade negra. Belo Horizonte: Autêntica. Acesso em: 15 nov. 2024. 2008
- NASCIMENTO, Abdias do. O genocídio do negro brasileiro: processo de um racismo mascarado. São Paulo: Editora Perspectiva, 2016.
- SANTOS, Antônio Bispo dos. A terra dá, a terra quer. São Paulo: Ubu Editora/PISEAGRAMA, 2023 SANTOS, T. D. L. B. KOPENAWA, Davi; ALBERT, Bruce. A queda do céu. Palavras de um xamã Yanomami… Revista Habitus – Revista do Instituto Goiano de Pré História e Antropologia, Goiânia, Brasil, v. 15, n. 1, p. 159–164, 2017. DOI: 10.18224/hab.v15i1.5905. Disponível em: https://seer.pucgoias.edu.br/index.php/habitus/article/view/5905. Acesso em: 10 nov. 2024.
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Pois é, Abdulai Djabi! Falar e escrever sobre a africanidade, principalmente, sendo uma africana do continente na diáspora, é uma das formas de não abandona as nossas raízes e de enaltecer as nossas resistências na diáspora.
Que texto incrível, Neita! É inspirador ver como você articula com profundidade e sensibilidade questões tão importantes como as africanidades no Recôncavo Baiano e a resistência cultural do povo negro. Seu olhar cuidadoso e embasado não apenas ilumina a riqueza da cultura afro-brasileira, mas também reforça a urgência de lutar contra as desigualdades e o racismo estrutural que ainda permeiam nossa sociedade.
Como você conecta história, cultura, política e meio ambiente é poderosa, mostrando como essas dimensões se entrelaçam nas práticas de resistência e resiliência. Destacar referências como Kabengele Munanga, Abdias do Nascimento e Davi Kopenawa demonstram o rigor e a riqueza do seu texto. Sem dúvidas, seu trabalho é uma contribuição significativa para o fortalecimento das reflexões que o Novembro Negro traz.
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