Mais discussões sobre como incentivar a leitura para o prazer e não para o dever

Ao iniciar uma breve pesquisa no Google com as palavras “como incentivar”, a primeira opção sugerida pelo site é o complemento “a leitura”. Afinal, parece ser a dúvida de diversos brasileiros. Como incentivar a leitura em um país que ainda a rejeita fortemente como modo de entretenimento?

Não é difícil encontrar textos com essa temática. Diversas editoras buscam maximizar suas divulgações, suas vendas e seus assuntos a fim de incentivar a leitura em um país onde a maioria da população tem muito mais com o que se preocupar no dia a dia do que se Capitu traiu ou não Bentinho. Pensando nisso, nossa finalidade aqui não é trazer apenas mais uma lista sobre hábitos que farão você magicamente aprender a gostar de ler, mas entender com empatia por que a maioria de nós não consegue desenvolver o gosto pelo hábito, e buscar uma solução que nos leve mais perto desse hábito que podemos adotar com prazer e não apenas pelos seus benefícios.

Como reagiríamos se alguém nos dissesse que a pessoa mais inteligente que conhecemos nos anos de escola pública ainda está quase que completamente abaixo da média? Pois é, sabe aquele cara que sofreu bullying por algum tempo por ser estudioso demais e tirar apenas 10 em todas as matérias? Ele estudou em um sistema de educação que ocupa o 53º lugar em uma lista de 65 países.

Quão triste é pensar que recebemos uma educação tão precária por aproximadamente onze anos de nossas vidas e somos treinados pelo governo para sair desse sistema analfabetos funcionais, que apenas assinam seus nomes e não se preocupam em ler contratos porque são “apenas formalidades”?

Na pré-escola, passamos os dois primeiros anos aprendendo a pintar dentro das linhas, dizer cores e socializar. No terceiro ano é que geralmente aprendemos as letras do alfabeto e como juntar silabas. Muitos ainda levam o primeiro ano do ensino fundamental praticamente inteiro para aprender, de fato, a ler e escrever o básico com letras de forma em caixa alta.

Cadernos de caligrafia? Talvez ainda existam por estética, mas completamente desnecessários agora que nossa prioridade é a comunicação escrita em teclados. Com isso, podemos ficar felizes já que os livros não são escritos à mão há vários séculos!

Durante muitos anos, vivemos acreditando que prejudicar nossa saúde era um grande sinal de status e motivo de respeito social. Fumar era elegante até os anos noventa (ou um pouco mais). Beber uísque? Tudo o que um homem de negócios deveria aprender! Sexo desprotegido era sinal de virilidade e um grande poder de persuasão. Passar horas sentado e fazer refeições rápidas mostrava que você era uma pessoa de negócios. Ser bonito e cuidar da alimentação? Coisa de gente fresca e sem conteúdo. Cuidar da saúde mental? Coisa de gente louca e que não consegue tomar o controle da própria vida. Brigar e demonstrar que quem manda é você? Sinal de respeito. Enfim, em diversas áreas de nossa vida aprendemos hábitos errados que começamos a desmistificar há pouco tempo. Porém, seria impossível esquecer em pouco tempo tudo o que aprendemos a fazer para nos distrair de nossos problemas e tudo o que ainda precisamos para viver com mais facilidade em um mundo onde lidamos com tantos problemas diariamente.

Pode parecer exagerado falar de todos esses âmbitos, mas em um país que destina 6% de seu PIB à educação, é necessário falar da cultura em todos os seus aspectos, isso inclui nossos vícios e problemas diários.

Muitos de nossos pais ganhavam salário mínimo durante nossa infância, o que apenas era suficiente para pagar as contas de casa e, caso nossa mãe ou pai ficasse em casa conosco enquanto o outro trabalhava, o dinheiro para comprar o material escolar do começo do ano já não existiria. Quando a pessoa que trabalhava chegava em casa, a outra estaria com o jantar pronto e finalmente poderia descansar assistindo TV e esquecendo dos problemas. O estresse mental de um dia cuidando de crianças, da casa e comida era tanto, que exercitar a leitura como forma de lazer só poderia ser uma brincadeira de mau gosto! Como, após todo esse trabalho e vivendo em um país que não me dá condições de aprender a interpretar textos, as pessoas teriam alguma alegria em ler e pensar em frases de duplo sentido, palavras difíceis que nunca usarim a na vida e autores que não escrevem nada que os representasse?

É assim que muitos de nós crescemos, vendo desenhos e sem entender os colegas que se apaixonam por leitura. Como em “a menina que roubava livros”, onde uma menina judia e pobre rouba livros que vão para o lixo durante o holocausto. Se ela tivesse televisão, desenhos e algo ideal para sua idade, poderia ainda ver tanta magia na leitura?

Em muitas discussões, os livros são usados como status, onde a maioria mostra entendimento sobre os clássicos e filosofia, livros que muitas vezes entenderam com auxílio da Wikipedia, porque não tiveram uma boa base para isso. Assim, não ousaria passar uma lista de hábitos que vão te deixar frustrado por não aprender a amar a leitura de uma hora para outra. Em vez disso, nossa melhor dica para você é: LEIA SOBRE O QUE AMA! Você gosta de BBB? Leia fóruns sobre os assuntos da casa, debata com pessoas que pensam diferente e seja aberto a outras opiniões. Você ama os clássicos? Procure autores que te representam em pensamento e leia suas histórias. Se você ama terror, existem vários livros sobre vampiros, lobisomens e até mesmo fadas que se popularizam todos os dias.

Você não consegue ver graça na leitura? Sem problemas, comece assistindo filmes sobre livros famosos e discutindo sua opinião com outras pessoas (mas, por favor, nunca seja a pessoa que diz [mas você leu o livro?]). Use todas as ferramentas disponíveis para debater suas ideias e aprender mais sobre as pessoas e suas crenças.

Talvez isso seja mais uma receita de bolo para quem não leria um artigo tão grande, mas para você que chegou até aqui, pode ser uma nova forma de incentivar alguém que você ama a abraçar novas ideias. Afinal, ler não é só vocabulário, mas aprender a ver beleza em todas as ideias. Esse é o primeiro passo para abraçar novos autores, livros e novos pensamentos, a valorizar o que o próximo tem a dizer em um mundo cada vez mais digitalizado, onde vozes são trocadas por letras. Desse modo, esperamos poder nos orgulhar cada vez mais no futuro, assim como nos orgulhamos de adotar novos hábitos e fazer parte de um país que vem abraçando as diferenças de cada indivíduo com cada vez menos preconceitos.

Quer uma indicação de leitura? Fale com alguém que realmente se importe com seus gostos. Não siga receitas de pessoas que já estão acostumadas a ler, mas sim de quem realmente valoriza seu conhecimento e sua vontade de se reinventar a cada dia!