Há algum tempo li em um livro de Coelho: “Quando você toma uma decisão a partir de sua essência, o universo conspira para realizá-la”, eu já havia encontrado a mesma ideia em um livro de Chesterton. Então aprendi que, se vivermos conectados com a essência, somos o universo e as ações que nossas mãos realizam não são conspirações, mas realizações, simplesmente consequências de aceitar nossa realidade ou criá-la. Mas principalmente estar sempre aberto às mensagens que os deuses nos enviam através de sincronicidades.
As sincronicidades me aproximaram das pessoas certas e me afastaram daquelas que não eram. Cada livro que escrevi, seja ficção ou não-ficção, me deixou imensas lições e, ao longo do caminho, as sincronicidades me ensinaram a escrever as histórias das pessoas de uma maneira especial. Estudá-las, planejá-las e desenvolvê-las de tal forma que a consequência seja um trabalho do qual tenho orgulho. Minha essência e meus deuses não aceitam de outra forma, e é que em minha própria história o tema subjacente é o dos valores morais.
Cada biografia que escrevo é uma história única que só vale a pena escrever se o resultado for excelente. Para mim, cada pessoa tem uma história que vale a pena escrever com a mesma dedicação que os grandes mestres dedicaram a um “David” de Michelangelo, uma “Noite Estrelada” de Van Gogh ou um violino Stradivarius. Olho para as pessoas e vejo um universo de obras de arte, e lamento não poder escrevê-las todas. É por isso que tenho certeza de que as sincronicidades me dirão quais eu posso escrever e quais eu não posso. Se eu não consigo capturar a essência da pessoa, eu não posso escrever sua história.
Respeito religiosamente as sincronicidades. Por exemplo, eu sei que você não está lendo isso por acaso. Você não precisa me contratar. Mas é necessário que quando você terminar de ler estas linhas você pare para pensar:
Por que as sincronicidades o trouxeram até aqui?
Qual é a história que você tem no computador, no papel ou na sua cabeça, que seria necessário colocá-la em um livro?
Cada biografia que escrevemos é uma história única que só vale a pena escrever se o resultado for excelente. Para nós, cada pessoa tem uma história que vale a pena escrever com a mesma dedicação que os grandes escritores dedicaram a suas obras mestras.
Não importa a idade, mesmo que você tenha apenas nascido, em um determinado tempo você vai morrer. Será em alguns meses, anos ou décadas. E quando isso acontecer, sua memória permanecerá até que o último de seus familiares e amigos tenha esquecido de você ou tenha partido, a partir daí você e seu nome serão como uma gota de uma onda que volta ao oceano.
Sabemos sobre heróis, gênios ou inventores porque eles escreveram sua biografia ou encomendaram a sua escrita, ou porque algum escritor pesquisou sua vida e escreveu sua história. Como no caso do livro “Siddhartha” de Herman Hesse, Prêmio Nobel de Literatura. Quantas pessoas no Ocidente souberam sobre Budha e a religião que emergiu dele, graças a esse pequeno livro? Para quantas vidas esse livro foi um ponto de virada, orientando a sua existência a uma direção melhor?
Temos duas maneiras de abordar uma biografia:
1 – Como uma biografia tradicional
Como biografia tradicional, será apresentado um livro na forma de um argumento no qual fatos, eventos e às vezes pensamentos ou reflexões são descritos em ordem cronológica. Fotos e documentos são colocados ou inseridos em seu lugar correspondente para ilustrar as fases da vida. A narração começa com o nascimento e pode ser feita em primeira pessoa, como se fosse o próprio protagonista que conta sua história, ou com um narrador na terceira pessoa, alguém externo que narra o que acontece com o protagonista. Este tipo de biografia é muito comum, e em nossa opinião é a razão pela qual as biografias fazem pouco sucesso entre o público. É difícil ler páginas e mais páginas contendo datas, lugares e fatos contados de forma neutra, sem emoção, com os quais não conseguimos fazer uma conexão.
2 – Como uma história romanceada
Como uma história romanceada, o argumento cronológico também é apresentado, mas dentro de uma estrutura adequada, utilizando recursos literários para apresentar os fatos, descrevendo-os através de uma narrativa interessante preparada para surpreender o leitor. Os fatos são os mesmos, não há ficção no romance. Quase nunca começa com o nascimento, mas em um momento antes de um evento que mudou a vida do biografado, que chamamos de “ponto de virada”. Ou apenas quando este fato está ocorrendo, e então, usando recursos temporários, adicionamos fatos do passado como causas ou sementes do futuro arco evolutivo do personagem.
A narração pode ser feita em primeira ou em terceira pessoa, embora o ideal é que seja narrado por ambos os narradores, o próprio protagonista em alguns casos e na terceira pessoa o narrador que adicionará descrições literárias.
Vejamos como exemplo o início da biografia de um empresário da área de alimentos, que nasceu em 1950 na Argentina, em Mendoza, que aos 10 anos de idade comprou sua primeira caixa de maçãs, aos 30 anos, já com seu próprio negócio de produtor de frutas e uma próspera frutícola, é acusado de sonegar impostos.
Uma pessoa que se identificou como agente da DGI, acompanhado de um policial, entrou no escritório, perguntou sobre o dono da empresa (que era eu), entrou na minha sala e me disse:
— O Senhor é Francisco Llorente?
— Sim, sou eu — respondi em pânico.
— Então venha conosco.
Fui conduzido algemado e fiquei preso por quatro dias no calabouço da 1ª. Delegacia de Mendoza, até que pude iniciar a minha defesa.
Foi assim que a provação começou.
Apesar do medo e da incerteza sobre o que iria acontecer, procurava manter a mente lúcida. Uma noite de solidão quente e úmida entre grades lembrei-me de um dia de março, creio que era 14 também, quando eu ainda não tinha 10 anos, e meu pai me ajudou a comprar uma caixa de maçãs. Eu havia juntado moedas fazendo pequenos serviços para os vizinhos e cortando flores em alguns jardins, e as vendia para senhoras de outra rua em pequenos ramalhetes que eu amarrava com barbante que costumava usar para fazer girar o meu pião. Tinha aprendido uma maneira infalível de jogar o pião, colocando a ponta para cima em vez do habitual, que era para baixo. Ganhei todos os “ratos”, que é como as carreiras de pião eram chamadas. Fazíamos uma linha no chão de terra com uma vara, e de lá tínhamos que jogar o pião o mais longe possível, e, claro, ele tinha que ficar girando. Nem sei por que esta lembrança feliz me veio tão vívida naquele momento tão desesperador.
Voltando às lembranças, Dom Sérgio, o verdureiro, trouxe para o armazém uma caixa de maçãs que eu tinha encomendado, já tinha dado a ele 21 pesos, no total eram 25. Meu pai, além de completar o que eu precisava para pagar, levou o caixote para minha casa, pois era grande e pesado para mim. Nenhum de nós poderia imaginar como este simples fato marcaria a minha vida.
Eu estava tão animado, tinha a minha própria caixa de maçãs! Fiz uma cesta com a roda de uma bicicleta velha, carreguei as primeiras 20 maçãs, depois de limpá-las até que fossem mais brilhantes que o sol escaldante daquele dia, pareciam apetitosas como as da Branca de Neve. Meu pai tinha me instruído a vendê-las a um peso cada uma. Lá fui eu, com o coração cheio de esperança e alegria. Confesso que a confiança do meu pai me fez sentir poderoso e capaz de fazer tudo o que eu quisesse. Imagine a surpresa dos meus pais quando em menos de duas horas eu estava de volta com meus primeiros 20 pesos. Até o meio-dia, depois de fazer outras saídas, tomado muito sol, conhecido novas pessoas e recebido vários nãos, havia recuperado o valor da caixa e já tinha lucro. Meu pai não quis me receber de volta os quatro pesos que eu devia a ele.
No dia seguinte fui o primeiro a me levantar, estava muito ansioso para sair à rua com minhas reluzentes maçãs, porém, tive que esperar a minha mãe fazer o café da manhã, pois não me permitia sair em jejum. Antes de terminar de vender as primeiras maçãs desse meu segundo dia de trabalho, eu já tinha combinado com Dom Sergio para me trazer duas caixas e deixá-las na minha casa, e já pagas com antecipação, assim meu pai não precisaria carregá-las. Almocei com o coração cheio de felicidade e quando fui para a escola tinha no bolso os primeiros pesos que ganhei na vida.”
Veja quantas coisas mostramos, sem dizer diretamente, neste relato:
Ficou clara a situação dos argentinos na época dos fatos, e a angústia e incerteza que os “mendocinos” (residentes de Mendoza) viviam.
Nosso personagem principal ficou caracterizado como um empresário da área frutícola, e parece bem-sucedido, embora sua empresa não esteja imune à crise econômica.
Mostramos a insegurança jurídica que os desmandos do governo provocavam, inclusive com prisões arbitrárias.
O relato compartilha o momento da prisão e os pensamentos e sentimentos que vieram depois que nosso personagem foi detido.
Solidão, medo, calor, umidade, e no meio disso, talvez como forma de se manter lúcido, vem à mente de Francisco Llorente uma lembrança feliz da sua infância (a brincadeira com o pião) e o início de suas atividades como empreendedor, ainda criança.
Fica claro que ele tinha bons pais, uma família bem estruturada, que era apoiado com a confiança do pai e os cuidados da mãe. Não era um menino fraco, gostava de brincar e inventar novas formas de jogar. Começou seu pequeno negócio com atitude, enfrentando o sol e o calor (se ele não fosse vender as maças, decerto em casa teria no mínimo sombra e água fresca). Ele se preparou juntando algum dinheiro, fez uma parceria com o dono do mercado do bairro, não esperou poder comprar uma cesta, mas adaptou algo que já tinha, e partiu para o sucesso.
Tudo isso e mais algumas mostramos no texto, fazendo um relato vivo e interessante.
Apostamos que você gostaria de saber como continuou a história do menino depois dos seus primeiros dias vendendo maçãs. E como seguiu a história de Francisco Llorente, o homem, depois de sua prisão.