Quando pensamos em romances ou lugares ideais, cenários específicos costumam vir às nossas mentes: um campo aberto cheio de flores, a sombra de uma árvore, um piquenique à beira de um rio… a natureza sempre nos evoca sentimentos de paz e pureza e foi desse fato que veio a literatura arcadista.
O arcadismo ou neoclassicismo surgiu no século XVIII como a principal escola literária europeia. Ficou famoso por retomar a cultura greco-latina de forma bucólica, sempre exaltando a natureza.
“Bucolismo é o termo utilizado para designar uma espécie de poesia pastoral que descreve a qualidade ou o caráter dos costumes rurais, exaltando as belezas da vida campestre e da natureza, característica do arcadismo. A base material do progresso consubstanciava-se nas cidades.”
O século XVIII ficou conhecido como século da filosofia graças ao renascimento cultural e iluminismo, dando início aos conceitos atuais de liberalismo, direitos humanos, cidadania, etc. Com todas as áreas de pesquisa em desenvolvimento e a ascensão intelectual, também se deu origem às Arcádias, que eram sociedades literárias que criavam novos padrões literários baseados nos padrões estéticos dessa nova sociedade.
“A UMA SENHORA QUE O AUTOR CONHECEU NO RIO DE JANEIRO E VIU DEPOIS NA EUROPA – Basílio da Gama
Na idade em que eu brincando entre os pastores
Andava pela mão e mal andava,
Uma ninfa comigo então brincava
Da mesma idade e bela como as flores.
Eu com vê-la sentia mil ardores.
Ella punha-se a olhar e não falava ;
Qualquer de nós podia ver que amava,
Mas quem sabia então que eram amores ?
Mudar de sitio à ninfa já convinha,
Foi-se a outra ribeira; e eu naquela
Fiquei sentindo a dor que n’alma tinha.
Eu cada vez mais firme, ela mais bela;
Não se lembra ela já de que foi minha,
Eu ainda me lembro que sou dela! (…)”
A adoração à vida no campo é um tema recorrente, assim como a relação desse estilo de vida com o amor e a pessoa amada.
“Torno a ver-vos, ó montes; o destino
Aqui me torna a pôr nestes outeiros,
Onde um tempo os gabões deixei grosseiros
Pelo traje da Corte, rico e fino.
Aqui estou entre Almendro, entre Corino,
Os meus fiéis, meus doces companheiros,
Vendo correr os míseros vaqueiros
Atrás de seu cansado desatino.
Se o bem desta choupana pode tanto,
Que chega a ter mais preço, e mais valia
Que, da Cidade, o lisonjeiro encanto,
Aqui descanse a louca fantasia,
E o que até agora se tornava em pranto
Se converta em afetos de alegria.”
(A poesia dos inconfidentes – Cláudio Manuel da Costa)
Entre os principais autores do arcadismo, podemos citar Manuel Maria Barbosa du Bocage, autor português do século XVIII. O autor foi preso pela inquisição devido ao conteúdo antiabsolutista e blasfemo de uma de suas poesias. Em cárcere, traduziu diversas obras latinas e francesas.
Suas obras possuem duas fases: uma satírica, cheia de erotismo e humor profano, e uma lírica, quando realmente começou uma produção que trazia as características do arcadismo.
“Olha Marília, as flautas dos pastores,
Que bem que soam, como são cadentes!
Olha o Tejo a sorrir-se! Olha: não sentes
Os Zéfiros* brincar por entre as flores?
Vê como ali, beijando-se, os Amores
Incitam nossos ósculos ardentes!
Ei-las de planta em planta as inocentes
As vagas borboletas de mil cores!
Naquele arbusto o rouxinol suspira;
Ora nas folhas a abelhinha pára.
Ora nos ares sussurrando, gira.
Que alegre campo! Que manhã tão clara!
Mas ah! Tudo o que vês, se eu não te vira,
Mais tristeza que a morte me causara.”
Ainda hoje, essa valorização da vida pacífica continua sendo um tema recorrente e criando best-sellers de romance histórico. A todos os fãs de Julia Quinn e Jane Austen, a escrita arcadista ajudará a entrar em contato com o autor que pode ser despertado em você!