Ontem à noite, com a Fátima, fomos jantar na Pizzaria Bráz, em Moema, famosa aqui em São Paulo. Sempre cheia, é comum ver pessoas do lado de fora aguardando uma mesa. Somos clientes antigos e, por isso, recebemos atendimento prioritário, um gesto de consideração para com os idosos. Alguns garçons nos cumprimentaram calorosamente, conhecemos e somos amigos de todo mundo e nos conduziram a uma mesa para dois. Pedimos as bebidas, deixando a escolha da pizza para depois, porque, para nós, estar ali não é apenas sobre comer, mas também sobre viver o prazer de estar em meio às pessoas, conversar e absorver a energia do lugar.

O ambiente era acolhedor e vibrante. A Pizzaria Bráz tem dois salões amplos, e ficamos no primeiro, que parece mais um boteco, ficamos próximos ao forno a lenha, de onde víamos o movimento incessante da cozinha. As mesas estavam lotadas, e o som de conversas animadas e risadas preenchia o ar. Entre goles das nossas bebidas e trocas de ideias sobre o futuro, minha atenção foi capturada por uma cena ao lado: sentaram na mesa vizinha, uma menina de uns oito anos com um homem, que presumi ser seu pai.

A menina era muito bonita, tinha um penteado que parecia uma mocinha de mais idade, mas estava séria, quase rígida. Sua expressão parecia dura para uma criança daquela idade. O homem, também sério, evitava olhar para ela, concentrando-se em tudo ao redor. Eles trocavam poucas palavras, e um silêncio desconfortável pairava entre os dois. Não havia afeto naquela mesa. Comecei a imaginar: seria ele um pai distante, que via a filha apenas ocasionalmente? Talvez fruto de um acordo entre pais separados ou de um relacionamento breve e impensado. A menina parecia carregada por uma dor que eu reconheci imediatamente.

De repente, fui transportado para a minha própria infância. Por um instante, era eu quem estava sentado diante de um homem: meu pai. Tinha a mesma idade daquela menina. E, assim como ela, não conseguia expressar nenhum afeto. Meu pai era um estranho, o homem que me abandonou quando eu tinha apenas cinco anos.

Eu tinha cinco anos e morava em São José dos Pinhais, perto de Curitiba. Meu pai, peruano, decidiu mudar-se para Lima, para estar perto da mãe, dos irmãos de sua família. Disse que nos levaria com ele. A ideia da viagem me enchia de alegria, iria conhecer a neve, a praia, o sol, as montanhas. Vendemos tudo: terreno, casa, móveis, colchão. No dia marcado, nossa casa estava vazia, pronta para a mudança. As malas estavam arrumadas.

Logo cedo, ele pediu que minha mãe e eu fôssemos ao centro da cidade buscar um documento necessário para a viagem. Voltamos rapidamente. Ao descer do ônibus, corri até a casa, animado, gritando: “Pai, pai, pai!” Mas, ao chegar, encontrei as portas trancadas e via pela janela que dentro não tinha ninguém e estava tudo escuro.

Pedi para minha mãe se apressar para abrir a porta. Entrei correndo, gritando por ele, mas ele não estava lá. Apenas uma mala grande e um bilhete. Minha mãe ao ler o bilhete caiu no chão, chorando, enquanto eu perguntava desesperado: “Cadê meu pai?” Então, ela disse, entre lágrimas: “Ele foi embora. Nos deixou.”

Naquele dia, algo dentro de mim mudou. Pensei e pensei e compreendi que ele nos abandonara. Ele viajou sozinho, deixando-nos sem casa, sem dinheiro, sem rumo.

Anos depois, ele voltou. Seus irmãos, que conheciam minha mãe por uma outra viagem, o obrigaram a nos buscar e levar para Lima. Lá estávamos, frente a frente, eu e aquele homem que era meu pai. Mas não havia diálogo, não havia intimidade. Eu sentia o mesmo que a menina na pizzaria: uma barreira intransponível, uma ausência de afeto que o tempo não curou.

Ele foi um homem inteligente, tinha hábito da leitura, e me ensinou a amar os livros. Nunca levantou a mão contra mim, nunca me bateu, nunca me humilhou. Mas também nunca construímos um vínculo. Hoje, estou com mais de 70 anos, ele morreu faz muito tempo, mas após todo esse tempo e após a sua morte, ainda não consigo sentir afeto por ele. Talvez seja essa a verdadeira marca de um abandono. De volta à pizzaria, vi naquela menina um reflexo de mim mesmo. Não sei como será o futuro dela, mas torço para que encontre sua paz. Algumas feridas nunca cicatrizam por completo, mas escrever sobre elas talvez seja o primeiro passo para entender sua profundidade e, quem sabe, perdoar.