Entrevista com o autor Jonas Marcelo Gonzaga

     Se tem algo que a gente AMA na Polo é conhecer nossos autores! Fazer com que se sintam em casa, naquele papo de quando se despedir a gente dizer “é cedo ainda”. Nossa editora é a casa de nossos leitores, de suas ideias, sentimentos, sonhos e realizações e ficamos cada vez mais felizes em ter essa relação próxima com todos!

     Cada autor com quem conversamos tem ideias e visões únicas, que nos ajudam a entender o que proporcionamos e o que podemos melhorar. Além disso, a oportunidade de compartilhar essas histórias é nossa alegria. Afinal, não é isso que os livros fazem?

Nesta entrevista tive o prazer de conversar com o Jonas, nosso querido autor e professor de arte que publicou três livros lindos conosco, entre eles, “O despertar do ironista”, uma coletânea de poesias que seguem a cronologia de seus 15 aos 33 anos, explorando pensamentos, amor, posicionamentos e questionamentos típicos da idade, com os quais grande parte de nós pode se identificar. 

Sem mais delongas, aqui vai nossa entrevista. Espero que gostem e achem tão inspiradora quanto nós achamos!

    1. Pode nos contar um pouco sobre você? De onde é, hobbys, seu trabalho, família, etc.

         Sou da cidade de Santo André, cidade na qual desenvolvi minhas primeiras expressões artísticas. Desde a adolescência me envolvi com a cena musical, tocando em banda de rock. Creio que seja das letras de artistas do nível da Legião Urbana, ou das simbologias que interpretava das bandas Nirvana, Pearl Jam e Silverchair, por exemplo, que eu me inclinei a escrever canções e um pouco, posteriormente, as minhas primeiras poesias aos 15 anos.

         Considero o ato de criar o meu hobby, mas não como algo menor, na verdade, meus hobbys estéticos (escrever poesia e criar músicas ao violão) visam um diálogo reflexivo sobre a existência humana. Agora, num senso prosaico, posso falar que tocar violão nos encontros de churrasco, assistir filmes nunca antes assistidos, mas que ficaram na lista pendente – tudo isto me faz me sentir bem… Refino o meu olhar, entro em outro movimento que me possibilita interpretar a vida com mais compreensão e conhecimentos.

         Sou professor de Arte há 11 anos na rede pública de ensino, já atuei como docente para todas as faixas etárias a partir dos 6 anos até os quase 80 anos na Educação para Jovens e Adultos (EJA). Compreendo que a Arte pode oferecer chaves e portas às pessoas, mais desdobramentos à história de si.

         Constituí a minha família ao lado da minha querida esposa, a Rosi – que aparece simbolicamente em muitas poesias, em específico cito-a na poesia “The Big Escape in Continuum”… Uma imagem materializada que veio das projeções da adolescência. Temos dois filhos bem especiais, o Giuseppe, de 4 anos, e a Olívia, de 1 ano; ambos são do mês de abril, mês de alegrias supremas. Eles nos surpreendem de formas diferentes… São os tesouros da casa!

    1. De onde surgiu sua paixão pelos livros?

         Eu sempre tive acesso aos livros: em minha casa havia um móvel super antigo que abrigava uma literatura bem variada, do espiritismo às obras do Sidney Sheldon… Livros sobre a fauna brasileira à geopolítica dos anos 1980. Incrível! Amava ouvir os meus pais lerem os livros para mim, inclusive os de caráter espiritual. Aliás, a própria Bíblia foi um alimento histórico e divinal, despertando-me à vida e sua historicidade, variedade de assuntos a serem desvelados. Os livros são os portadores do amanhã; a riqueza humana nos é transmitida por eles… A memória (que está escrita) possibilita novas reinterpretações e refigurações a quem está obstinado com o futuro e suas novas fronteiras, mesmo que interligadas ao passado.

    1. O que te incentivou a escrever seu próprio livro?

    A música me conectou com a minha verve artística, com as minhas facetas da poética pessoal; os versos das letras são um passo ao lirismo que se espera de uma poesia, que é fundada na liberdade da própria identidade do poeta, do artista que trabalha com as linguagens. Encontrar a sua voz se faz necessário para compreender os jogos mordazes da vida, assim como as belezas que se escasseiam, mas que nos nutrem à expressão estética, seja qual for.

         Escrever Coração Sentido foi um ato concomitante à destruição de sentidos humanos em meio à pandemia, mas, ao mesmo tempo, um alento que me fez cotejar a poesia sutil do próprio sentido e significado da nossa existência frágil. E interface à tentativa de encontrar uma saída mais digna e justa à nossa trama vital, dramática, prosaica, irregular, por vezes tediosa, marcada com matizes fortes de um neoliberalismo compromissado com poucas famílias bilionárias, tendo em vista a crescente população humana renegada. Então, o Coração sente mesmo.

    1. Como foi o processo de escrita? Teve dificuldades? Já havia escrito antes ou foi a primeira experiência?

         Os primeiros poemas surgiram logo após a publicação do livro anterior, “O Teatro Ironista: vidas encenadas”, de 2019. Há uma nota no mínimo esquisita na gênese do Coração Sentido: antes da pandemia, escrevi um poema chamado “Vírus, vais-te!”, finalizado em dezembro de 2019; logo após, em tão pouco tempo, o Corona havia se disseminado pelo mundo, atingindo a América pela costa do pacífico, especificamente, pelos EUA. O “meu vírus” apenas se tratava de uma experiência dolorosa que eu estava passando, sem a menor correlação de uma possível e duradoura pandemia super mortal… O pior, é que raramente observamos condutas políticas e pessoais pautadas pela ética e compreensão humana. Ações imprudentes de poucos, causaram prejuízos ao Coração Sentido de muitos. Está aí, um detalhe em meu livro que por menor que seja, mostra uma vicissitude do nosso tempo – mas, digo, naturalmente, com este fenômeno pandêmico, busquei soluções poéticas para metaforizar “os nossos novos tempos”… Inclusive, inconscientemente, devo ter voltado à música… Agora, que estou (acho) compreendendo a minha obra! Fui dedicando muitos poemas aos/às grandes poetas/poetisas da música como se recorresse às vozes do meu passado para minha própria segurança, conforto, beleza, admiração pela vida…

    1. Quais seus gêneros e livros favoritos?

         Esta pergunta me faz pensar… De forma optativa, olha só, pedi aos meus pais a assinatura da “Turma da Mônica” quando eu tinha uns 9, 10 anos, e sei que na sequência li a maioria dos livros da Série Vaga-Lume, de 1973, que contava com títulos, como “A ilha perdida”, “O escaravelho do diabo”, “O rapto do Garoto de Ouro”… Bem, eu mergulhei nestas narrativas, elas abriram muitos mundos para mim; eu cursava a quinta série, sexta série, como chamávamos; hoje, seriam o sexto e sétimo anos.

         As pessoas crescem… Ainda assim, recordo-me que aos 15 anos devorava William Shakespeare! Voltava da biblioteca da escola com cinco, seis livros toda semana, lia quase um livro por dia, amava ficar inserido nos enredos…

         Gostaria de destacar que na parte adulta da vida, li sobremaneira os clássicos da dramaturgia, de Ésquilo, Sófocles e Eurípedes, passando por toda uma galeria de autores consagrados, como Molière, Beckett, Brecht, Nelson Rodrigues às dramaturgias contemporâneas, contempladas, por exemplo, com Luís Alberto de Abreu.

         Afora ao Teatro, li a literatura de poetas e poetisas bárbaras… Aos 15 anos trabalhei como garçom em festa infantil e comprei “A divina comédia”, de Dante! Pirei com “O Inferno”… Muito imagético para mim! Gostaria de destacar alguns autores aos quais devo muito, pois encontrei-me na vida por conta deles também: Friedrich Nietzsche, Thomas Mann, Hermann Hesse, Franz Kafka, Arthur Schopenhauer e, finalmente (no sentido estritamente alemão) Hannah Arendt – que filósofa!

         Agora, sempre li Freud, Jung (a quem tenho predileção) neste gênero; poetas como Carlos Drummond, Mário Quintana, Fernando Pessoa, Pablo Neruda, Vinicius de Moraes, Cecília Meireles, Florbela Espanca… A lista é longa como deve ser.

    1. Como conheceu a Polo?

    No ano de 2016 defendi a minha Dissertação de Mestrado em Educação e pretendia publicá-la, torná-la mais pública, vamos dizer… Portanto, pesquisei e “varri” as editoras que se propunham a tal empreitada, então, após análise criteriosa por meio de diálogos, optei pela Polo por passar a segurança, qualidade de materiais expostos no próprio site, o tratamento ofertado desde o início das conversas e, assim, não chegou a ser uma decisão difícil.

    1. Nos conte algo significativo que a escrita te ensinou.

         Bela pergunta! Isto vai ao encontro do que penso sobre a atividade reflexiva. Escrever é por si só um ato exclusivo de imersão, de alta reflexividade; escrever obra literária, que se pretenda dialógica junto ao público, já é algo comprometedor, pois devemos ofertar a ingenuidade perante as narrativas ali tratadas, independentemente do gênero literário… Sempre há alguma história a ser interpretada e que vai além do que o autor possa imaginar. Temos que, ardentemente, ansiar e agir com destino a algum sentido, sentido que se faz urgente, emergente, fundamental – e todos o tem, basta se analisar – de forma que, possamos contribuir com a coletividade, com as populações. Escrever obras é abrir passagens a possíveis futuros, e eu me fidelizo à esta certeza de me sentir em inacabamento e, portanto, de mãos juntas com o leitor, construir mais significados à nossa existência.

    1. Pode compartilhar seu trecho favorito de seus livros?

         Pensando de forma recortada os meus três livros de poesia, posso citar alguns versos que ainda me dizem muito. Em “O despertar do ironista” (2016), aprecio demais a poesia “2013” na qual há dois versos “Meus quinze, não esquentem… Seus trinta, serão melhores…” Estes versos os escrevi aos 15 anos, prospectando (com certa incerteza) uma vida mais larga, farta, positiva…

         No tocante ao livro “O teatro ironista: vidas encenadas” (2019), gosto principalmente da questão conceitual de “ficcionar” a realidade, são versos que fogem para horizontes imagéticos, cujas fronteiras permitem de forma convidativa à uma interpretação mais ao reino da simbologia, uma celebração à metáfora. Partilho da poesia “Dos camarins às cenas” em cujos versos “Dos camarins às cenas somos o que reinventamos para nos vertermos mais / Sentirmos mais, sabermos mais, vermos em profundidade mais de nós mesmos!”, revela-se este movimento entre o ficcional e a pura realidade, no qual procuramos o inédito em nós mesmos, com intuito de mergulharmos em saberes e camadas de felicidades – em poucas palavras, fazer a vida valer a pena! Gosto da ideia de extrairmos do dia comum uma nova paisagem para a nossa alma se alargar.

         Neste atual livro que será publicado, “Coração Sentido” (2021), destaco a poesia “Sou Latino Coração Sentido”, último poema do livro que consolido com o meu amigo ator, Sergio Guizé, em específico com estes versos: “Sou artista, sou compositor de melodias que desdobram a Existência! / Sou artista, sou camaleão orgânico, artisticamente em Resistência! / Sou artista, carrego as nuanças da alma desassossegada… / Sou artista, quisera-me ser outro, quisera-me ser nada!”; encontramos traços de Carlos Drummond ao tratarmos do “desassossego” latino, sempre há o desejo por um porvir mais fausto, lindo de se viver, e a luta por tal feito idealizado; buscamos neste poema a exposição de uma busca poética que se desdobra, já que amamos muitas linguagens artísticas e deslizamos por elas diariamente. O livro “Coração Sentido” é um livro sobre a nossa contemporaneidade pandêmica e seus dissabores e um ato de esperança e de percepção aos aspectos lindos que ainda resistem entre tropeços da existência, como a beleza da amizade, do contágio pelo amor à Vida, ao Sagrado!

    1. Qual seu conselho para quem está começando agora?

         Ah, conselhos são projeções bem particulares e tal, e, honestamente, fujo de conselhos – e, veja a contradição: sou um educador, um arte-educador, um quase-doutor: lido com mediação de saberes, não? O meu conselho, na verdade, para quem deseja escrever um dia – e isto é um toque, uma sinalização, tão somente, ao/à querido/a leitor/a desta entrevista: caminhe pelas leituras que lhe forneçam prazer, em primeiro lugar, não temos compromisso com nenhum grau de dificuldade. Bem, leia com prazer, depois, varie os gêneros, até que alcance a variedade e profundidade dos seus autores. É importante que o leitor se conheça enquanto identidade leitora, ou seja, qual é a sua liga com determinados temas, há uma predileção nas pessoas… E o que fazer com isto? Acredito que devemos nos provocar, naturalmente, alargando os saberes com voracidade! Mas, aqui vai um conselho, portanto: mantenha-se humilde ante o saber! Só assim conseguirá se desafiar (literariamente) perante um mundo de possibilidades e antagonismos. Escrever exige leitura prévia, densa e contínua. É uma eterna preocupação e respeito ao leitor, é uma tarefa que lhe põe em estado de alteridade e de vigília para sempre… Um/a ótimo/a escritor/a se preocupa com a vida alheia, por isto, o frio na barriga tal qual o artista cênico vive a sentir: expor-se de coração aberto (e aqui cabe ressaltar – com ciência e experiência) só para quem realmente se preparou para assumir as responsabilidades humanas e artísticas.

    1. O que você gostaria que as pessoas sentissem/pensassem ao ler sua obra?

         A obra está aberta… Ela é um possível manancial de experiências do dia a dia das populações, assim como se apresenta carregada por uma esfera cujo teor estético, projetivo, imaginativo, aspira por se desdobrar a quem aceitar o desafio, o convite sincero. Honestamente? Gostaria que ao lerem “Coração Sentido”, novos encontros possam ser possibilitados, encontros com partes pouco ouvidas de si mesmo, encontros felizes com facetas de si que não estavam a fim de diálogo, encontros de congregação consigo mesmo, encontros experimentados com o sabor de paz e autoconhecimento, encontros de luz e trevas – mas, de harmonização perante à complexidade da vida, encontros que sugestionam brindes e cafés sem açúcar! Gostaria que as pessoas com o Coração Sentido pudessem intuir novos horizontes e destinos para si, que o niilismo pudesse permanecer de lado e novos ares, com muito esforço pessoal, entrassem em seus pulmões e sonhos, a despeito de todas maldades praticadas em nome de enes ideologias… A humanidade ainda não despertou verdadeiramente! Alguns determinados artistas, cientistas, humanistas – e para ser honesto, milhares de pessoas comuns, como eu e você (se me permite dizer assim) sabemos, dignamente, o caminho a ser percorrido, não há muito mistério para as nossas relações humanas, digo isto num sentido de interpessoalidade. O mundo precisa de compreensão, o homem precisa se compreender, fazer o seu dever de casa: pôr-se no lugar do outro, “Amai-vos uns aos outros, como Eu vos amei” – síntese suprema!

           Como um bom poeta, a conversa com Jonas se mostrou muito artística, metafórica e esclarecedora. É sempre incrível ver essa abordagem carregada da pessoalidade de quem realmente quer expor seus pensamentos e nos fazer refletir!

           Essa foi nossa conversa com o autor de hoje. Nossa meta é conversar cada vez mais e conhecer todos os nossos autores, assim como mostrar para vocês as ideias de livros que podem se tornar seus favoritos!