Nunca pensei em escrever um artigo. Sou leitora voraz de textos alheios, mas confesso que, quando Ivo me sugeriu transformar uma conversa em um texto, hesitei. O convite nasceu de uma comparação que fiz casualmente entre cães e gatos — algo que observo há anos como tutora de felinos — e que, segundo ele, merecia ser compartilhado.
Sempre achei curioso como os cachorros se comportam como crianças pequenas: são expansivos, demonstram amor de maneira escancarada, pulam no colo, fazem festa quando você chega, te seguem pela casa. Amam com urgência, com o corpo todo, como quem diz: “Estou aqui, me ama também!”
Já os gatos… ah, os gatos são como adolescentes. Amam, claro que amam, mas à maneira deles. Você precisa decifrar seus sinais, respeitar seus silêncios, entender que o afeto existe mesmo quando não se mostra. Com eles, o amor é mais sutil, mas não menos profundo.
Moro com dois gatos adoráveis, Tony Stark e Shuri, que compartilham a casa comigo, com minha filha Ana Laura e meu marido. Em nossa rotina, eles nos ensinam todos os dias sobre os limites e as sutilezas de um relacionamento verdadeiro. Não esperam que eu chegue para correr até a porta; pelo contrário, quando volto de uma viagem, fazem questão de me ignorar solenemente por algumas horas, como quem diz: “Sumiu? Pois agora aguente nossa mágoa.” É só depois de algum tempo, quando já provaram seu ponto, que se aproximam, se enroscam nas pernas e retomam o contato.
Esse comportamento sempre me pareceu uma metáfora do amor na sua forma mais madura. Aquela que não precisa de demonstrações constantes, mas se manifesta quando há espaço, respeito e troca. Com os gatos, aprendi que não é sobre fazer festa a cada reencontro, mas sobre confiar que, mesmo em silêncio, a relação continua existindo.
É interessante como, em meio à vida corrida — onde muitas vezes buscamos respostas rápidas e afagos imediatos —, os gatos nos desafiam a desacelerar. Eles nos pedem presença verdadeira, não performance. Nos convidam a ouvir o que não foi dito, a perceber os detalhes, a construir intimidade no tempo de cada um.
Na relação com eles, somos convidados a ser menos invasivos e mais observadores. A respeitar o espaço do outro sem deixar de oferecer companhia. A entender que há dias em que o melhor carinho é deixar a janela aberta e o sol bater no pelo.
Talvez por isso eu ache o relacionamento com os gatos tão fascinante. Eles não são carentes, são complexos. Não exigem atenção constante, mas se magoam se você os ignora por tempo demais. São mestres em nos ensinar sobre vínculos reais — aqueles que não se impõem, mas que se constroem, dia após dia.
Com o tempo, percebi que minha convivência com os gatos também me transformou como mãe, como esposa, como amiga. Aprendi a escutar mais, a respeitar os momentos de recolhimento, a confiar naquilo que é cultivado com constância, e não com intensidade passageira. Se os cães nos ensinam sobre a alegria do amor incondicional, os gatos nos mostram a beleza do amor consciente. Aquele que escolhe ficar, mas não se deixa aprisionar. Que observa, que espera, que retorna. E que, no seu próprio tempo, sempre encontra uma forma de se fazer presente.
Foi numa videochamada de trabalho com a Gisela — em meio à conversa sobre a divulgação de um livro de autor da Polo — que o assunto inesperadamente mudou de rumo: gatos.
Ambos trabalhamos em home office, o que significa que, vez ou outra, somos interrompidos por acontecimentos domésticos. Naquele momento, minha gata Nina entrou na sala, e não resisti a apresentá-la. Gisela, então, comentou que tem dois gatos — e pronto, a conversa deslanchou.
Falamos sobre hábitos, rotinas e peculiaridades desses felinos misteriosos. Mas foi a forma como Gisela descreveu seus gatos que me chamou a atenção: segundo ela, os cães vivem uma infância permanente, enquanto os gatos habitam uma espécie de adolescência contínua. Essa perspectiva me pareceu tão original e sensível que a incentivei a escrever um artigo para o Portal da Polo, abrindo espaço para que outros leitores também pudessem refletir sobre essa relação afetiva e muitas vezes filosófica com os animais.
O resultado é um texto delicado, profundo e provocador, que agora temos o prazer de compartilhar por aqui. Leiam, comentem e, quem sabe, tragam também seus relatos — afinal, todos temos alguma forma de amor que nos atravessa a vida.